quarta-feira, 21 de setembro de 2011

AlenteJo se escreve com “J” de José de Sousa!


Na semana passada recebemos a visita dos amigos António Maria Soares Franco (VP Comercial e de Marketing) e Sofia Parada (Gestora de Marketing e Vendas para as Américas do Sul e Central) da tradicionalíssima casa José Maria da Fonseca (“JMF”) – a mais antiga produtora de vinhos de mesa e Moscatéis de Setúbal de Portugal. Eles vieram para o lançamento oficial no Brasil de dois grandes vinhos: o “J” de José de Sousa 2007, topo de gama dos vinhos da José de Sousa, a adega alentejana da JMF; e o raro Moscatel Roxo Colecção Privada Domingos Soares Franco 2001, um vinho doce absolutamente delicioso feito pelo tio do António.


No almoço com a imprensa, lá na Adega Santiago (regida pelo simpático amigo Jaci, é garantia de boa comida e serviço eficiente), além desses dois lançamentos, também foram degustados (eu bebi tudo, garanto!) mais dois vinhos: o Domini Plus 2007, produzido pela JMF no Vale do Rio Douro; e o José de Sousa Mayor 2007, vinho intermediário da vinícola José de Sousa.

No futuro escreverei sobre o Domini Plus e sobre o Moscatel Roxo. Hoje, no entanto, vou me concentrar nos dois vinhos alentejanos, os “Josés”, que são a razão do título e desse texto que continuo a seguir...

Os primeiros registros de produção de vinhos pela Casa Agrícola José de Sousa Rosado Fernandes (a José de Sousa) datam do ano de 1878, o que a torna uma das vinícolas mais antigas do Alentejo.

A José de Sousa foi comprada pela JMF em 1986 e tornou-se a realização de um sonho da família Soares Franco (proprietária da JMF há cinco gerações e descendente da esposa do Sr. José Maria da Fonseca, o fundador), que há muito desejava produzir vinhos alentejanos, mas buscava uma propriedade de forte prestígio e tradição.

A Herdade do Monte da Ribeira, onde se encontra o vinhedo da José de Sousa, está localizada na estrada para a lidíssima cidadela medieval de Monsaraz (construída no topo de uma montanha e toda murada) e tem uma área de 120 hectares, dos quais 72 plantados com vinha. Em solos de origem granítica e com excelente exposição aos raios solares, plantaram-se ao longo dos anos, particularmente no princípio dos anos de 1950, as uvas tintas Trincadeira, Aragonez e Grand Noir*, além de outras variedades portuguesas.


Monsaraz
A José de Sousa combina tradição e história com tecnologia de ponta. Na adega tradicional, chamada "Adega dos Potes", onde se produz vinhos seguindo técnicas milenares, há lagares para a pisa das uvas e 114 ânforas de barro para a fermentação alcoólica. Na adega moderna, por sua vez, há 44 tanques de aço inoxidável e toda a tecnologia indispensável para a vinificação. É a perfeita combinação de artesanato e tecnologia.



A Pigeage - mergulhando a manta (ou "chapéu") de cascas/sementes no vinho. Haja equilíbrio!

Sou fã dos vinhos José de Sousa desde que os provei pela primeira vez em 2009. Creio que a explicação para a admiração que tenho por esses vinhos passe pelo fator surpresa que eles me proporcionaram, pois são vinhos incomuns. 

Me explico melhor. Em regra, a maioria dos vinhos alentejanos produzidos atualmente tendem a ser excessivamente alcoólicos, saturados de nuanças de fruta sobre-madura (lembrando geléia), com super-extração fenólica, carência de acidez natural e demasiadamente marcados por aromas/sabores de carvalho novo. Além de enjoativos e entediantes, no meu ponto de vista, esses “alentejanos modernosos”, seguidores da fórmula ‘bomba-de-fruta + alto grau alcoólico + carvalho novo extra-tostado’, me lembram mais certos vinhos do Novo Mundo do que, propriamente, vinhos portugueses. Os vinhos de José de Sousa, ao contrário, me proporcionam uma viagem no tempo e me levam para um Alentejo de outrora, mas que ainda existe. Um Alentejo bem português, rústico-elegante, orgulhoso de suas raízes e tradições. Um “Alentejo de raiz”, que não quer ser Novo Mundo e que se liquefaz em vinhos com álcool, fruta, acidez, taninos e carvalho na medida justa do equilíbrio.

É bom ressaltar que, felizmente, os vinhos da José de Sousa não são os únicos representantes desse Alentejo clássico que eu tanto gosto. Há outros produtores que também não se vergaram aos ventos da moda modernista. Uma casa que muito me agrada é a Herdade Monte da Penha, membro dessa tropa de heróis da resistência que seguem orgulhosamente alentejanos. Não poderia deixar de citar também a Quinta do Mouro que, comandada pelo dentista (sim, é isso mesmo, dentista!) Miguel Louro, produz vinhos personalistas, longevos e deliciosos.

Bem, vamos aos Josés...

Produtor: José de Sousa (José Maria da Fonseca).
País/região: Portugal, Alentejo.
Nome do vinho: José de Sousa Mayor Vinho Regional Alentejano.
Uva(s): 63% Grand Noir, 22% Aragonez e 15% Trincadeira.
Vinhedo: 3,5 hectares; idade média das videiras 50 anos.
Tipo: tinto                              Safra: 2007                Álcool: 13%
Fermentação alcoólica: parte em ânforas de barro, parte em tanques de aço.
Amadurecimento: 10 meses em barricas novas de carvalho francês.
Aparência: vermelho escuro e brilhante.
Aromas: puros (sem defeitos), com intensidade média e complexidade média+. Seus aromas não são óbvios. Há uma fruta negra sutil e elegante, lembrando tâmaras e figo seco; toques de ervas e folhas, como louro e tabaco; flores secas; especiarias; carvalho discreto atuando como coadjuvante e um charmoso toque mineral-terroso, quiçá proveniente da ânfora de barro.
Boca: pura, com taninos sutilmente marcantes, mas de boa qualidade; o saboroso frescor da acidez típica deste vinho; álcool bem integrado (comportado); corpo médio+; e longa persistência, terminando com uma saborosa nuança de cranberry.
Conclusão: para mim, este é um tinto de personalidade, com perfil clássico, sério e distinto da maioria. É um vinho para a mesa (como todos os bons vinhos, diga-se de passagem). Já está gostoso de se beber, mas, talvez ainda seja jovem para alguns. Para os que preferem tintos evoluídos, recomendo guardá-lo por mais 2-4 anos ou até mais. Bebi certa vez um Mayor com dez anos de idade que estava fantástico.
Classificação: Excelente-.
Preço/vendedor: R$ 175,00 / www.inovini.com.br

Produtor: José de Sousa (José Maria da Fonseca)
País/região: Portugal, Alentejo
Nome do vinho: “J” de José de Sousa Vinho Regional Alentejano
Uva(s): 45% Grand Noir, 45% Touriga Franca e 10% Touriga Nacional
Vinhedo: 0,4 hectares; idade média das videiras 50 anos
Tipo: tinto                              Safra: 2007                Álcool: 13%
Fermentação alcoólica: em ânforas de barro e efetuada por leveduras silvestres.
Amadurecimento: 15 meses em barricas novas de carvalho francês.
Aparência: vermelho rubi escuro e brilhante (mais intenso do que o Mayor).
Aromas: puros (sem defeitos), com intensidade média+ e complexidade média+. No “J” os aromas me parecem ser mais precisos e intensos. Há nuanças marcantes de fruta negra (algo como ameixa e tâmara) e vermelha (um doce-azedo que me lembra cranberry); notas balsâmicas; cedro; carvalho na medida justa; tabaco; especiarias; chocolate negro; e, neste também, o charmoso toque mineral-terroso proveniente, quem sabe, das ânforas de barro.
Boca: pura, com taninos em quantidade, mas já super polidos; o saboroso frescor conferido pela Grand Noir e pela Touriga Franca; álcool perfeitamente integrado (comportado); encorpado e denso, mas com textura sedosa; longa persistência final, terminando com um saboroso gosto de frutas negras e especiarias.
Conclusão: um grande tinto, que demonstra intensidade sem deixar de ser elegante e equilibrado. Digno de figurar entre os melhores de Portugal. Assim como o Mayor, é um vinho para a mesa e já está delicioso, mas, certamente, irá evoluir maravilhosamente bem com mais uns 2-4 anos na garrafa, podendo ser ainda mais longevo.
Classificação: Excelente+.
Preço/vendedor: R$ 280,00 / www.inovini.com.br

Obs.: Tanto o Mayor quanto o “J”  foram engarrafados sem serem filtrados ou estabilizados por processos térmicos, de modo a preservarem todas as suas virtudes e caráter.

*A uva Grand Noir – rara e quase uma exclusividade da José de Sousa no Alentejo - é uma uva tintureira, ou seja, sua polpa tem antocianinas, os pigmentos pertencentes ao grupo dos flavonóides responsáveis pela grande variedade de cores das frutas, flores e folhas, que vão do vermelho-alaranjado, ao vermelho vivo, roxo e azul. Foi criada em 1855, na França, pelo viticultor Henri Bouschet, através do cruzamento de duas ‘vitis viniferas’, a Aramon e a Petit Bouschet.
Paulo Amaral, enólogo da José de Sousa, me relatou em 2009, quando visitei a vinícola, que a uva Grand Noir tem como característica não ser uma super concentradora de açúcar e, como conseqüência disso, consegue preservar boa parte dos seus ácidos naturais. No Alentejo dos dias atuais, que tem verificado aumento considerável das temperaturas médias, a Grand Noir é um ‘super-trunfo’ da José de Sousa, pois garante vinhos com graus alcoólicos moderados, bom frescor, mais equilibrados, elegantes e gastronômicos.


Que as ânforas e a Grand Noir continuem a encantar os bebedores de vinho...

Abraços,

Edu Paes

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